COMO PAIS PODEM AJUDAR NO TRATAMENTO PSIQUIÁTRICO DE SEUS FILHOS

COMO PAIS PODEM AJUDAR NO TRATAMENTO PSIQUIÁTRICO DE SEUS FILHOS

 

Quando crianças e adolescentes começam tratamento psiquiátrico, obviamente, uma grande parte do tratamento foca neles mesmos, enquanto pacientes. É o paciente que fará sua psicoterapia e nela precisa sem engajar, construir uma positiva aliança terapêutica com seu psicoterapeuta, aprender e usar as estratégias para manejo de seus sintomas, fazer as mudanças de hábitos e de comportamento e, quando necessário, tomar regularmente o medicamento prescrito.  No entanto, na prática clínica é notória a diferença no curso e prognóstico dos transtornos em pacientes com diagnósticos semelhantes, graus semelhantes de gravidade, mas cujas famílias têm posturas diferentes em relação ao seu tratamento.

 

Pais que entendem que sua participação no tratamento dos filhos é fundamental, se interessam em compreender o que podem fazer para ajudar e, o mais difícil, efetivamente fazem o que é preciso ser feito, podem contribuir grandemente para o sucesso do tratamento.

 

Então, como pais podem ajudar?

 

Primeiro, tentando entender o filho, a pessoa que ele é, conhecer sua personalidade, suas ideias, sua identidade, características que são naturalmente dele, para que não busque a terapia com a expectativa de mudar o que é a essência daquele ser, não tente mudar o que o seu filho é. Às vezes escuto: “eu não entendo que meu filho tenha essa crença”; “eu não aceito que minha filha se vista dessa forma”; “meu marido não consegue nem olhar para meu filho com o cabelo desse jeito”; “na minha família, nenhuma mulher vai numa profissão como essa”. Cada indivíduo é singular, com características, necessidades e formas de se expressar únicas, que precisamos reconhecer e respeitar, mesmo que não consigamos entender...

 

Na sequência, entender o transtorno que o filho tem, quais são os sintomas, como o transtorno costuma evoluir (para não esperar resultados impossíveis), quais são as opções de tratamento, quanto tempo geralmente é preciso para tratar adequadamente o transtorno. Também é importante conhecer como o transtorno funciona no seu filho: cada pessoa é única e os transtornos se manifestam de formas diferentes em diferentes pessoas. Por exemplo a depressão, algumas pessoas terão mais sintomas cognitivos (dificuldade de concentração e foco, lentidão de pensamento, queda de desempenho escolar), outras terão mais sintomas emocionais (choro, tristeza, angústia, falta de esperança), outras ainda, terão mais sintomas neurovegetativos (fadiga, desânimo, perturbação do sono e do apetite) Assim: quais são os sintomas mais significativos para seu filho? Quais são os gatilhos que desencadeiam os seus episódios? O que piora os sintomas e o que traz alívio dos sintomas? Tudo isso importa saber.

 

Entender questões de desenvolvimento que podem interferir com o quadro do filho também pode ser útil. Ele tem alguma questão que incremente insegurança ou dependência? Ele ainda toma mamadeira, chupa chupeta ou dorme com os pais numa idade em que já não é mais próprio manter tais comportamentos? Enurese (dificuldade para controlar o xixi)? Encoprese (dificuldade para controlar a evacuação das fezes). Ele está conseguindo manter bom desempenho na escola? Questões como estas podem interferir com o bem-estar da criança ou jovem.

 

Prestar atenção na dinâmica da família. Quando vamos tratar, principalmente problemas comportamentais, ter uma estrutura familiar tranquila, se possível, mas pelo menos organizada dentro de uma rotina consistente, é imprescindível.  Outro ponto relevante: há uma comunicação fácil e aberta em casa? Você se coloca à disposição para conversar com seu filho? Ele se sente à vontade para conversar com você e vice-versa? Como as pessoas abordam problemas e resolvem conflitos em casa? Algumas famílias evitam falar de problemas; outras confundem conflitos com brigas e vão muito para o embate. É natural que numa família haja divergências de opinião e conflitos. O ideal é que pais deem um modelo positivo de discussão de problemas e ideias e que também ajudem a resolver problemas e conflitos sem brigas.  Pense no que você diz nos momentos de discussão, nos picos de estresse, é mais provável que você diga para seu filho: “Assim não dá” ou “Não dá para aguentar você”? As duas colocações incitam emoções bem distintas nas crianças e adolescentes, e podem ter efeitos diferentes na autoestima deles. Eu sugiro que uma boa conversa em família comece com os adultos ouvindo; depois falando com calma, evitando hostilidade.

 

Um aspecto fundamental para ajudar no tratamento dos filhos, mas bastante desafiador, é tomar ciência das suas próprias dificuldades como ser humano, também como pai ou mãe. Que tipo de exemplos você estabelece para seu filho na maneira como se expressa, como lida com a sua vida, com os seus relacionamentos? Você tem habilidades interpessoais e recursos emocionais para lidar com os desafios da vida? Consegue manter-se tranquilo, ser tolerante, buscar alternativas, manter uma atitude positiva? É uma pessoa nervosa, ou talvez explosiva, impulsiva, rancorosa, inflexível ou pessimista? Você costuma buscar a resolução de problemas ou fugir deles? Coloca-se como protagonista ou como vítima na resolução de problemas? Enfim, esse tipo de reflexão é pertinente e, sempre que possível, ir um passo além. Trabalhar nessas dificuldades e mudá-las, seja dentro do trabalho com a família na terapia do filho, seja dentro da sua própria terapia individual – o que algumas vezes é recomendável.  

 

Escolher um profissional bem preparado, parece algo óbvio, que não precisaria ser dito. No entanto, às vezes, as pessoas esquecem de informar-se sobre a formação dos profissionais com quem estão se tratando ou tratando seus filhos. O que eu quero dizer é que doenças psiquiátricas precisam ser tratadas por psiquiatras, assim como doenças neurológicas por neurologistas, cardiológicas, por cardiologistas, e assim por diante. Cada médico especialista recebe treinamento específico para atuar dentro da sua área. No que diz respeito à psicoterapia, tanto médicos psiquiatras quanto psicólogos (que não são médicos, mas também são profissionais de saúde mental) podem praticar psicoterapia, mediante treinamento para tal.  Há muitas abordagens psicoterápicas diferentes e não há uma única forma de trabalhar que seja a ideal para todo mundo. Portanto, é essencial que cada família encontre um profissional que trabalhe com uma abordagem terapêutica com que se sinta confortável, com quem consiga estabelecer uma boa aliança terapêutica e, consequentemente, trabalhar colaborativamente, seguindo as recomendações do tratamento.

 

Enquanto a psicoterapia pode ser conduzida por psiquiatra ou por psicólogo, somente os psiquiatras – porque são médicos- podem prescrever medicamentos. Em psiquiatria, algumas condições podem ser tratadas sem medicação, outras podem ser tratadas com medicação e outras devem ser tratadas com medicação. Sempre que for necessário o uso de medicamento, é imprescindível que ele seja usado da forma adequada e, pequenos detalhes, fazem grande diferença. A maior parte dos tratamentos psiquiátricos exige uso regular de medicação por um determinado tempo. Assim o remédio deve ser tomado diariamente no horário prescrito pelo médico. Alguns remédios devem ser tomados preferencialmente de dia, outros à noite. É importante não esquecer de tomar a medicação todos os dias e é importante, sim, tomar sempre no mesmo horário. Alguns pacientes tomam seu medicamento cada dia num horário diferente, dificultando a manutenção de um bom nível sérico do medicamento (um nível mais estável da medicação no sangue). Pais de crianças e adolescentes precisam ser os responsáveis pela medicação dos seus filhos, administrando-a diariamente no horário prescrito e guardando-a em lugar seguro, longe do alcance do filho, garantindo a proteção contra uma ingesta que possa por em risco a vida da criança ou do adolescente.

 

É possível trabalhar com crianças e adolescentes sem a participação dos pais. Todavia, são muitos os benefícios para os filhos quando os pais se dispõem a também fazer parte do tratamento. A questão é perguntarem a si mesmos se realmente estão preparados para isso porque, sem dúvida, a tarefa é árdua...

 

 

Marcela Moura – 05/12/20

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Dra Marcela Alves de Moura Especialista em Psiquiatria - Associação Brasileira de Psiquiatria. Mestrado e Doutorado em Psicologia Clínica - Washington State University - EUA

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